20110130

Amantes num espelho

E quando, no auge de sua aventura voluptuosa, o prazer lhe invade e percorre o seu corpo de vez e estás prestes a entrar em erupção, ela se divide entre a vontade de captar o momento, não fechar os olhos, e seu instinto de fechá-los e se perder.

Não que ela negue a beleza visual do ato ou tenha medo de se prender a uma lembrança do que vê. Apenas não quer se apegar a esse quadro limitado que é seu amante nu junto de seu corpo, com o rosto tomado de um jubiloso êxtase.

Tem medo da nostalgia que isso pode lhe causar quando essa paixão já tiver se perdido nas brumas do tempo e da inevitável separação. Prefere mergulhar no escuro, se entregar ao infinito que lhe traz imaginação. Atrai-lhe mais a liberdade de ter toda a beleza do amor presa em nada além de uma sensação pura e imaculável de suas paixões.

Olha os dois no espelho: é tudo o que ela sente por ele, preso naquele exato momento. E tão efêmero quanto o mesmo reflexo.

agosto de 2010, o impacto do 19

19 anos já! Isso mesmo?! A um passo dos 20 e os 25 estão logo ali, na virada da esquina. E esse mistério, essa incerteza absoluta quanto ao que encontrarei no outro lado, se é que chegarei lá, me aterroriza um pouco.

Sim, numericamente se passaram 19 anos, 228 meses, mais de 990 semanas, e uma conta imensurável de dias somados e subtraídos, da minha vida. 18 invernos e uma primavera se passaram. Tendo hibernado grande parte de minha infância, a perdi e não gostei muito de como a encontrei nos escombros da minha memória. Está destruída, deformaram-na e em vão tento restaurar os fragmentos que restaram e tirar-lhe as incrustações.

Para os outros, tudo passa rápido, enquanto se olha para trás. Já para mim, os anos e o tempo passam dolorosamente inconsistentes. Fugazes, mas também inertes. A vida escorre viscosa e turva pelas minhas mãos.

Sou teoricamente jovem, mas há muito me sinto velha. Como quem nunca viveu e já não tem mais tanto tempo para isso. A juventude que vêem em mim é superficial e frágil. Minha jovialidade, me é difícil retê-la quando a uso de forma a encobrir minhas tristezas e dúvidas perante os outros, tão volátil ela é.

Queima fácil qualquer faísca que me venham a atiçar. Daí inflama e incendeia tudo. Depois, dos momentos e das pessoas, só vejo diante de mim suas cinzas e fumaça, que embaralha minha visão. E eu, fico como que em carne viva, tamanha minha dor, estuporada. Assim, qualquer coisa que eu tente tocar ou qualquer um que venha encostar-se a mim, me machuca. Umas feridas que nunca se fecham nem eu consigo tratá-las.

Sou um pouco de plasma, íons superaquecidos em sinapses descontroladas nas áreas emotivas do meu cérebro. E sou feita de imagens, reflexos e lembranças que são guardadas por cada pessoa que me conheça à sua própria maneira e conseqüência.

Dentro de mim só há o vazio contido numa caixinha feita de pesadelos lúcidos, na maioria, um pouco de tristeza, indignação, uma nostalgia irreal e o vento circulando louco. Ou será que sou eu que estou presa dentro dela, encerrada sob solidão, más lembranças, decepções e frustrações não sublimadas? Atormentada por uma saudade de felicidade e amor pueris que já não tenho certeza se em algum momento existiram. De qualquer maneira, não consigo abri-la, para jogar fora esses ressentimentos irracionais ou me libertar.

Eu tinha inventado, sem perceber, um amor para me distrair. Encontrei-o no oceano de um olhar no qual eu mergulhei e em cuja imensidão eu me perdi. E nas profundezas de seus mistérios era engolida e consumida a cada dia mais. Quase me afoguei.

Sentia as paredes dessa caixinha serem serradas. Não sei se por mim ou outras pessoas. Só sei que dói: é meu coração. Nós na garganta me impedem de falar, me trancam a respiração nessas horas.

Sonho em abrir os olhos e poder enxergar o céu claro, azul límpido, ou melhor ainda, colorido como uma aurora e com arco-íris... Todos os dias, pelo menos dentro de mim. Quero um horizonte à minha frente para ultrapassar, por mim mesma e poder voar pousando onde quiser. Não sirvo pra ser peixe!

20110123

Insônia primaveril

Chuva de primavera,
Noite insone.
Frio e calor disputando meu corpo.
A inquietude do vazio me rondando...
Um delírio colorido,
Como se fosse florido.
Ou não.

20110121

A visão de outro nunca será tão boa quanto a sua de si mesmo.
Viva e morra com ela. Porque no final é tudo o que você tem.
Se perdê-la, acaba perdendo a si mesmo e a tudo mais.

Georgia O'Keefe



Essas palavras me marcaram muito quando vi o filme que leva seu nome. Eu nunca tinha ouvido falar dela antes, encontrei o DVD por acaso e adorei. Essa Georgia foi uma pintora norte-americana, falecida em 1986. Ela foi casada com o fotógrafo Alfred Stieglitz, outra surpresa para mim. O amor deles parece lindo, é espirituoso, intenso, mas... Enfim, só sei que a admiro muito mais, pela sua feminilidade e sua força, também por sua ousadia. Vale a pena conhecê-la...
    
   (esta é pra ti, Mila...)
     By Yousouf Karch